Pesquisar este blog

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Em Que Você Acredita?


Natal é para a maioria dos brasileiros a principal data religiosa, mas, diante de uma sociedade cada vez mais materialista, muitos ignoram o lado espiritual dessa festa e a vêem apenas como uma época de trocar presentes. Há quem diga que as questões religiosas já não despertam tanto interesse, mas será que a sociedade não dá mesmo atenção à vida espiritual? Afinal, a fé é coisa do passado ou não? 

Uma pesquisa exclusiva de Seleções, realizada também em 14 países da Europa e na Argentina, investiga quais são as crenças do homem moderno no que se refere ao plano invisível e revela que 95,3% dos brasileiros crêem em Deus. 

No Brasil, a pesquisa foi realizada pela Internet com 2.600 pessoas maiores de 18 anos, das cinco regiões do país. A metodologia do levantamento permitiu aos entrevistados refletir sobre suas crenças e responder por escrito a algumas questões. 

"Há uma tendência de individualização da espiritualidade no mundo ocidental. As pessoas vivem suas crenças na intimidade, sem vínculos com instituições - por exemplo, lendo textos sagrados ou fazendo meditação em casa", afirma o professor Lísias Nogueira Negrão, coordenador do Centro de Estudos da Religião Duglas Teixeira Monteiro, da USP. E acrescenta: "Por aqui isso é mais acentuado: o brasileiro constrói o próprio cardápio religioso, combinando elementos de diversas religiões. É muito grande o número de pessoas com alguma duplicidade religiosa." 

A grande questão "Deus existe?", 95,3% dos consultados deram uma resposta firme e categórica: "Sim." 

"Deus, para mim, é uma certeza, um pai amoroso, zeloso, infinitamente justo e bom. Ele nos orienta, mas também nos chama à responsabilidade por intermédio de nossa consciência", diz o espírita Jessé Nunes Queiroz, 45 anos, do Rio de Janeiro. 

Dos 16 países pesquisados, a porcentagem dos brasileiros crentes em Deus só é menor do que a registrada na Polônia (97%). A média dos europeus que crêem em Deus é de 71%. (O índice mais baixo é o da República Checa - com apenas 37% - e Portugal é o segundo mais fervoroso - 90% acreditam em Deus -, seguido surpreendentemente pela Rússia, que tem 87% de fiéis, 15 anos após o desmantelamento do regime comunista.) Na Argentina, o índice chega a 74% e nos Estados Unidos, país de tradição cristã, outra pesquisa apurou 79% de crentes em Deus. 

Apenas 1,3% dos brasileiros pesquisados foram enfáticos ao responder "Não" à pergunta sobre a existência de um ser supremo. "Deixei de crer há cerca de dez anos, quando me dei conta da realidade do mundo. Não acredito em espiritualidade, e sim na ciência. Acho que para tudo existe uma explicação lógica", defende o ex-católico Danilo Neder, 21 anos, representante de vendas em Friburgo (RJ). 

De acordo com o IBGE, nos últimos 40 anos o número dos sem-religião no Brasil saltou de 0,5% para 7,4% da população. A falta de uma religião, no entanto, não significa que o brasileiro esteja se tornando ateu. De acordo com o estudo Mudança de religião no Brasil - desvendando sentidos e motivações, do Centro de Estatística Religiosa e Investigações Sociais (Ceris), dos brasileiros que se consideram sem-religião, menos de 1% se diz ateu. 

Quarenta e cinco por cento dizem ter uma espiritualidade própria, sem vínculos com instituições. "O estudo mostra que a discordância de princípios, normas e doutrinas leva ao abandono da religião. Dos sem-religião, 80,1% já haviam sido vinculados a uma. Hoje existe a valorização de uma religiosidade independente", ratifica a socióloga Sílvia Regina Fernandes, professora do Instituto Multidisciplinar da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. 

Entre os sem-religião que responderam à pesquisa, Wilson Vidurrizaga Teles, 49 anos, não esconde sua decepção com as crenças tradicionais. "Acho que religião está virando um simples comércio. Não vejo necessidade de entrar numa igreja; para mim, é mais sensato me recolher e ler a Bíblia sozinho, na minha casa", afirma o inspetor de qualidade, que vive em Paranaguá (PR). 

Se deus tem muitas faces, as definições sobre o que Ele significa para cada pessoa também são infinitas. A maioria dos consultados (65,7%) acha que Deus é amor e, para 59,9%, Ele está presente na natureza. "Para mim, é um ser supremo, algo que não vemos, mas sentimos que existe. É como o ar", define a advogada Marivone Oliveira, 47 anos, de Recife (PE). A maioria também exalta Deus como um ser justo (59,7%); que dá livre-arbítrio (55,7%); que existe em nosso interior (46%); e é uma força impessoal (32,5%). 

"Deus é um pai que ama seus filhos e espera que eles um dia cheguem à perfeição, pois assim os criou", escreveu a nutricionista Celina Viezzer, 60 anos, de Porto Alegre (RS). 

Cada vez mais exercer a própria fé independe de pertencer a uma religião. Somos mais de 125 milhões de batizados na religião católica, segundo números do censo de 2000, mas, de acordo com estudo do Ceris, somente 29,3% declaram ir à missa pelo menos uma vez por mês. 

"Já freqüentei muito a missa, mas hoje meu contato com Deus é direto: a qualquer momento que quiser, posso orar", diz o jornalista Luiz Ari Teixeira, 49 anos, de Ponta Grossa (PR). 

Em outros países de grande tradição católica, como a Irlanda ou a Polônia, que também contam com uma significativa maioria de pessoas batizadas no catolicismo, mais de 60% delas vão regularmente à missa. 

Para os brasileiros, a vida cotidiana da fé se expressa em outro leque de possibilidades muito amplo, que se estende bem além das paredes de um templo. 

"Raramente vou à missa, mas não vivo sem Deus. Agradeço a Ele ao acordar, várias vezes durante o dia e ao me deitar. Aprendi a não me queixar da vida: sei que Deus sabe o que faz e sempre nos favorece", afirma a universitária Goretti Andrighetti, 37 anos. 

Esse testemunho coincide com o de muitos outros consultados na pesquisa, que, embora não participem ativamente de um culto, dedicam parte de seu tempo à vida interior e espiritual. Basta ver que 93,7% acreditam no poder das orações. 

Mas se a pesquisa de Seleções não deixa dúvidas de que Deus existe para quase todos os brasileiros, ela também mostra alguns traços particulares de nossa religiosidade: num país 74% católico, somente 58,2% acreditam na vida após a morte. "Deus para mim é tudo, mas acho que a vida só tem significado se houver outra após esta aqui. As pessoas que a gente ama, e que já morreram, devem estar olhando por nós", pondera o católico Maurílio Pedro Leite, 39 anos, fiscal da Secretaria da Fazenda, de Penha (SC). Já o veterinário Marcos Paulo Pinheiro, 30 anos, de Salvador (BA), é como São Tomé: "Creio em Deus e agradeço a Ele tudo o que me acontece de bom, mas para mim a gente nasce, cresce, se reproduz e morre. Depois, acabou. Precisaria ver para acreditar que existe vida após a morte." 

A sondagem revelou ainda que mais da metade dos internautas consultados crê na força do destino (52,9%) e em mau-olhado (51,5%). 

"A fé dos brasileiros não está num Deus transcendental que protege e cobra um comportamento ético. Há uma expectativa mágica em relação a Deus, daí podermos coagi-lo com promessas, oferendas ou gestos como bater na madeira", explica o professor Eurico Gonzalez dos Santos, do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília. 

Metade dos participantes afirmou acreditar que o Céu, ou Paraíso, é uma realidade e que os espíritos do bem existem; e um número muito próximo (48%) crê também na existência de espíritos malignos. 

"Eu acredito em tudo: espíritos, feitiçaria, horóscopo e até em simpatias, que já fiz e funcionaram. Às vezes também acendo uma vela para meu anjo da guarda", confessa a artesã Verônica Quintana, 21 anos, de Foz do Iguaçu (PR). 

O rol de crenças não pára por aí: 38% dos consultados acreditam em passes (ato de passar as mãos repetidas vezes diante ou acima de uma pessoa, com o objetivo de magnetizá-la ou curá-la pela força mediúnica) e em previsões do futuro por meio de: horóscopo (22,6%), quiromancia (16,3%) e tarô (15,9%). 

Nenhum comentário:

Postar um comentário